Candidatos à prefeitura prometem Guarda Municipal armada e policiando ruas

483

17555864No entanto, para proposta se tornar realidade em Santa Maria é necessário mudar a lei e ter aval do STF

Por: Lizie Antonello ZERO HORA

Ter uma Guarda Municipal armada e fazendo policiamento ostensivo com rondas pelas ruas, parques e praças é o desejo de muitos santa-marienses. A vontade foi expressa como prioridade por moradores de 14 dos 41 bairros do município na série de reportagens Diário nos Bairros/Eleições 2016.

De olho no pedido dos eleitores, o investimento na Guarda vem sendo prometido pelos oito candidatos à prefeitura desde o começo da campanha eleitoral. Dois deles anunciam uma guarda armada para o próximo governo, quatro falam em reforço no serviço sem entrar no mérito do uso de armamento e dois se dizem contra a utilização de armas de fogo pelos guardas.

A questão é que, independentemente da vontade do futuro administrador ou da população de Santa Maria, a decisão de ter uma Guarda Municipal atuando no patrulhamento preventivo, aqui ou em qualquer município do país, cabe ao Supremo Tribunal Federal (STF). Desde 20 de agosto de 2014, tramita no STF uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5156). Ajuizada pela Federação Nacional de Entidades de Oficiais Estaduais (Feneme), a ADI contesta a Lei Federal 13.022, de 8 de agosto de 2014, que dispõe sobre o Estatuto das Guardas. A lei ¿incumbe às guardas municipais, instituições de caráter civil, uniformizadas e armadas, conforme previsto em lei, a função de proteção municipal preventiva, ressalvadas as competências da União e dos Estados.¿

Em parecer dado pela Advocacia Geral da União (AGU), o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, manifestou-se pela legalidade do estatuto e se limitou a definir ¿sua forma de atuação na proteção de praças, parques, edificações e logradouros públicos, por exemplo, e das pessoas que ali se encontrem.¿ Por outro lado, o procurador considera que algumas atribuições dadas às guardas invadem funções de outros órgãos.

De acordo com a procuradora jurídica da prefeitura de Santa Maria, Anny Desconzi, qualquer que seja a decisão do STF, a legislação municipal precisa ser alterada para o uso de armas. A lei que criou a Guarda na cidade, em 2011, fala que ela ¿trabalhará preferencialmente com uso de armamento não letal¿. O novo modelo poderá vir de cidades como Caxias e Pelotas que têm guardas armadas com atuação ostensiva.

Para especialista é preciso muito mais

Foto: Fernando Ramos / Agencia RBS

Para Eduardo Pazinato, coordenador do Núcleo de Segurança Cidadã da Faculdade de Direito de Santa Maria (Fadisma), há muita discussão sobre o tema e um profundo desconhecimento por parte dos candidatos a prefeito, não só de Santa Maria, sobre a extensão do papel dos guardas municipais.

– O estatuto (das guardas) opera uma transição de um paradigma tradicional de atuação das guardas (da proteção ao patrimônio dos municípios para uma guarda comunitária na defesa da vida) – explica o especialista.

Na prática, conforme Pazinato, significa que ¿os guardas passam a ter uma atuação mais proativa, preventiva, coibindo condutas inclusive criminais.¿

Secretaria de Segurança

De toda a forma, continuará cabendo aos municípios a decisão de adotar ou não o uso de armas de fogo por parte dos guardas. Isso poderá variar, dependendo do tipo de atividade e local de atuação. Para isso, terão de ser cumpridos os requisitos legais previstos no estatuto do desarmamento, que prevê estatuto próprio para a guarda, corregedoria e ouvidoria próprias.

– O que precisaria é, em primeiro, a compreensão do papel que as guardas podem exercer em uma estratégia integrada de policiamento municipal preventivo. Em segundo, promover os ajustes normativos e organizacionais para que a guarda tenha o protagonismo – diz Pazinato.

O futuro prefeito vai deparar com a necessidade de avançar nessa questão. Santa Maria não tem uma Secretaria de Segurança Pública. Atualmente, ela está subordinada à Secretaria de Mobilidade Urbana. Sem orçamento próprio, a guarda divide a verba com outros setores vinculados à pasta, como trânsito.

– Os candidatos têm de pensar o tema da segurança como atribuição do município: ter uma secretaria de segurança, convênios para criar um observatório de segurança – acredita Pazinato.

Em Caxias e Pelotas, guardas têm armas e atuam nas ruas

Foto: Guarda Municipal de Caxias do Sul / Divulgação

Mesmo tendo caráter ostensivo, os 115 guardas destinados ao trabalho nos locais públicos e de serviço em Santa Maria não vão para o enfrentamento. E a orientação é essa mesmo. O motivo é que eles não podem usar armas de fogo, apenas armamento não letal. O superintendente da Guarda, Luiz Oneyde, diz que a cidade precisa de, no mínimo, 200 guardas (55 a mais do que o efetivo) e defende a criação de um grupo de 10 homens com armas de fogo por turno.

Em Caxias do Sul, que tem população de 480 mil habitantes, os 193 guardas municipais concursados atuam com armas de fogo. Eles fazem proteção tanto nos prédios públicos, escolas e postos de saúde quanto nas praças e nos parques. A cidade ainda tem o programa municipal de pacificação restaurativa para evitar a judicialização de questões, e a guarda de lá participa do processo fazendo a mediação desses conflitos.

– A guarda, protegendo a comunidade escolar, os usuários das unidades de saúde, com poder de polícia, fazendo patrulhamento no entorno desses locais, onde a população utiliza serviços, está prestando uma grande atividade de segurança – diz o secretário de Segurança Pública e Proteção Social de Caxias do Sul, José Barden da Rosa.

Sem arma, é desperdício

– Agente de segurança sem arma é desperdício de dinheiro público. A guarda tem que atuar com poder de polícia no município, mas para isso tem de estar qualificada e com convênio com a Polícia Federal. Além disso, tem de ter corregedoria e ouvidoria para fiscalizar ato ilegal – diz Ricardo Fugante Martins, diretor da Guarda de Caxias.

Em Pelotas, com 343 mil habitantes, a Guarda conta com 246 servidores. Segundo o secretário de Justiça Social e Segurança, Luiz Eduardo Longaray, ela foi instituída em 1991 para proteção dos prédios, mas com a lei federal tomou proporção de força pública de segurança.

– O efetivo da Brigada Militar nas ruas não supera 150 homens. Nós temos 100 homens. Imagina se tirarmos esse efetivo da cidade – diz Longaray.

Foto: Arte DSM / Reprodução