Oscar Bessi: Polícia e Direitos Humanos

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tgfPOR OSCAR BESSI CORREIO DO POVO

O meu amigo e leitor santiaguense Jéter Silveira é uma jovem mente humanista. Autor de textos fantásticos na internet, mantemos contato frequente. Ex-militar, acadêmico de Direito e filho de brigadiano, vez ou outra é acusado de ser um crítico intolerante de esquerda contra a polícia. Mania equivocada de se dividir a humanidade em “times”. Como há poucos dias, ao criticar uma ação policial. Por isso decidi reproduzir sua explicação ao, inclusive, recomendar meu livro “O silêncio mais profundo” aos seus amigos. Abaixo, trecho do que Jéter escreveu (no meu blog, em www.correiodopovo.com.br, está na íntegra).

“Meu pai foi policial e cresci ouvindo suas histórias que me influenciaram a optar pela carreira militar. Quando criança, lembro que meu pai saía em missões para ‘garantir a segurança pública’ nas invasões das terras de fazendeiros pelo MST. Ficávamos nervosos, preocupados e, à noite, em volta da cama da minha mãe, orávamos para que Deus guardasse o pai e o trouxesse bem para casa. Em nosso país, infelizmente, existem apropriações de discursos por parte de determinados grupos políticos, que fazem existir uma falsa dicotomia entre Segurança Pública e Direitos Humanos como se fossem coisas opostas. Aliás, tais grupos lucram muito com isto. Todavia, a sociedade perde. Elas não são coisas opostas, ao contrário, são inseparáveis e a garantia de um é indispensável à garantia do outro. A Câmara de Vereadores de POA elaborou um documento sensacional no Mapa de Segurança Pública e Direitos Humanos. Dentre as soluções apresentadas, uma era o incentivo e a valorização das ‘lideranças criativas’. E Oscar Bessi, para mim, é a principal liderança criativa na desconstrução da dicotomia mitológica no Rio Grande do Sul”.

Tirando a gentileza do amigo, com elogios que não mereço, preocupa-me também os discursos febris de lá e de cá acerca de determinados fatos. As generalizações. Confesso: em quase três décadas de trabalho na linha de frente, houve um custo em minha carreira, como processos e etc. Faz parte, quem está na chuva é para se molhar e jamais deixei de atuar, e com a energia necessária, contra autores de crimes. A sociedade paga para isto. O que nunca me autorizou abuso de poder e falta de raciocínio. Existem erros? Sim. No governo deste ou daquele. Seres humanos erram, ainda mais sob tensão. E é da cidadania reclamar destes erros, o contribuinte é quem banca essa máquina. O que não dá carta branca à ferocidade unilateral e ao preconceito. Sim, porque policiais são alvos de preconceitos, discursos fanáticos que eu mesmo já fui alvo, até em rodas ditas “intelectuais”. Pena. Há uma maioria de seres humanos maravilhosos e brilhantes em meio ao mar dessa lama – que não foram eles que espalharam. E, repito, quando aceitamos estas vozes que incitam povo contra povo, perdemos. Eles? Não.

Abaixo, texto na íntegra de Jéter Silveira (foto):

11048783_1132646666754532_734196761641701666_nHá alguns dias compartilhei umas postagens criticando atuações de policiais militares que reputei lamentáveis. Amigos vieram argumentar, alguns acusaram-me de “ser contra a polícia”. Disseram-me que nunca viram eu postar algo defendendo a polícia, ou o policial, era “só metendo o pau”. Enganados, porém.

Meu pai foi policial, e eu cresci ouvindo suas histórias, que me influenciaram a, em dado momento, optar, sim, pela carreira militar, que recentemente abandonei.

Quando era criança, lembro que meu pai ia em missões para “garantir a segurança pública” quando ocorriam invasões de terras de fazendeiros pelo MST, e ficávamos nervosos e preocupados. À noite nos reuníamos em volta da cama da minha mãe, e orávamos para que Deus guardasse o pai, e o trouxesse bem para casa.

Não me envergonho de minha história. Nem um pouco.

Em nosso país, infelizmente, existem apropriações de discursos por parte de determinados grupos políticos, que fazem existir uma falsa dicotomia entre SEGURANÇA PUBLICA e DIREITOS HUMANOS, como se fossem coisas opostas uma à outra. Aliás, tais grupos políticos lucram muito politicamente sobre essa falsa dicotomia.

Todavia, enquanto os políticos lucram, a sociedade perde. Segurança pública e direitos humanos não são coisas opostas, pelo contrário, são inseparáveis e a garantia de um é indispensável à garantia do outro. A Câmara de Vereadores de POA elaborou um documento sensacional no Mapa de Segurança Pública e Direitos Humanos, se não me engano, em 2014.

Dentre as soluções apresentadas, uma era o incentivo e a valorização das “lideranças criativas”. E Oscar Bessi, para mim, é a principal dessas lideranças criativas na desconstrução desta dicotomia mitológica no Rio Grande do Sul.

Dos amigos que vieram questionar-me, policiais, perguntei-lhes e descobri que não conheciam (!!!) o capitão Bessi. Capitão da Brigada Militar, em serviço ativo, escritor de vários livros muito bem sucedidos e com temáticas de repercussão social, e colunista do jornal Correio do Povo, é um grande exemplo para mim.

Acredito que não se pode falar em defesa pública dos policiais – especialmente os militares – no Rio Grande do Sul sem que se mencione o Capitão Bessi, ou o Oscar Bessi, escritor.

Nesse caos (que vontade de citá-lo quando descreve o caos !!) que é a violência cotidiana dos nossos ambientes urbanos, na nossa avidez e necessidade de lutar, muitas vezes atropelamos e esquecemos que estas mulheres e estes homens que vestem farda são tão titulares de direitos humanos como qualquer outro.

Chega de falar, para mim. Na verdade, só queria deixá-los com um trecho do livro O Silêncio Mais Profundo (Oscar Bessi) que ganhei, autografado, de presente da querida Harieádine Maier há um tempo já. Leiam, e vejam se não dá vontade de continuar???

“O primeiro tiro só matou uma lâmpada. O suficiente para lhe arrancar a máscara de coragem que talvez ainda sobrevivesse em seu rosto por defesa ou mania, obrigação ou bandeira, instinto ou esperança. Vá saber. Encolheu ainda mais o corpo, como se tivesse o poder de diminuir o tamanho e o peso, de se transformar num fio invisível ao olho inimigo, que ainda não o percebera ali. Graças a Deus! Pois, se os descobrisse, seria um massacre. Sempre sonhou morrer de velho, num sono sereno, de tempo vencido. E só o que não queria nesta vida era acabar sob o deboche vitorioso de um bandido. Tanto tempo depois, aos vinte e dois anos de serviço ativo na Brigada Militar, todos eles muito bem vividos na linha de frente, após passar por tantas e mais algumas, cuja totalidade já até esquecera, mas ainda o marcava, sabia: era este o seu maior fantasma e conflito. Povoando a insônia que desistira de tratar, a possibilidade de morrer sem honra nem graça, sob a mão sádica e doentia de um imprestável qualquer, lhe consumia e arrepiava. Não queria partir sem tempo para acertar as contas com os que amava, mesmo sem admitir, mesmo em segredo, apenas para dizer que amou e isto foi sincero, e também para acertar os ponteiros com os que odiava – mas em relação a estes, tudo bem, se não tivesse tempo. Nem fazia tanta questão assim.” Trecho de O Silêncio Mais Profundo, de Oscar Bessi.