Governo do RS propõe desconto para reduzir dívida com precatórios

17638427Câmara de Conciliação convoca credores com mil títulos à espera de pagamento para negociar quitação mediante abatimento de 40%

Por: Juliana Bublitz ZERO HORA

Ao completar um ano, a Câmara de Conciliação de Precatórios dá mais um passo na tentativa de negociar acordos para reduzir a dívida do Estado com precatoristas, estimada em R$ 11,7 bilhões — o equivalente a 10 folhas de pagamento do Poder Executivo. Desde o fim de outubro, os donos de 1.033 títulos no valor de R$ 600 milhões estão sendo chamados para dizer se têm interesse em participar das negociações, com início previsto para dezembro.

São cerca de 7 mil pessoas (muitos precatórios têm mais de um titular). Se todas aceitarem as condições da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) — o que é difícil, em razão do deságio de 40% no valor dos títulos —, o custo desses papéis para os cofres públicos poderá ser reduzido em R$ 240 milhões. É pouco diante do tamanho do passivo e da fila de espera de 54,1 mil precatórios, mas a PGE avalia a medida como um avanço no enfrentamento do problema histórico.

— Esperamos que as pessoas respondam à convocação (o prazo termina em sete de novembro). Com as conciliações, conseguimos pagar mais credores com o recurso disponível. É uma forma de acelerar os pagamentos — afirma Vitor Hugo Skrsypcsak, coordenador da Procuradoria de Precatórios e Requisições de Pequeno Valor da PGE.

Criada por lei estadual em outubro de 2015, a Câmara passou a receber, mensalmente, metade do dinheiro destinado pelo Palácio Piratini à quitação de precatórios — o valor total, em média, é de R$ 37 milhões mensais. Desde então, duas rodadas de conversação foram promovidas, com resultados incipientes (67 acordos firmados).

A partir de agora, a PGE espera que o trabalho deslanche e se torne contínuo. Para dar conta da demanda, uma equipe de procuradores passou a se dedicar exclusivamente à área, com apoio da juíza Kétlin Carla Pasa Casagrande, da Central de Conciliação e Pagamento de Precatórios do Tribunal de Justiça do Estado.

— Revisamos tudo para garantir que a ordem cronológica seja respeitada. É muito importante que esses credores atendam ao chamado. Quem não está na lista e tem interesse em participar, também pode nos procurar para deixar registrado — destaca a magistrada.

Redução de 40% é alvo de crítica

Apesar de ser uma notícia positiva para as contas do Estado, a aposta nas conciliações é vista com ressalvas por quem representa os interesses daqueles que têm dinheiro a receber.

Vice-presidente da Comissão de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil no Estado (OAB-RS), Ricardo Bertelli classifica como injusto o percentual de desconto. Ele lembra que, segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), os acordos devem ser realizados com redução “de até 40% do valor do crédito atualizado”. A PGE vem aplicando a porcentagem máxima.

— É um completo desrespeito com os credores, que já estão há muito tempo esperando e ainda perdem 40% do que têm direito a receber, mesmo tendo um precatório antigo ou de menor valor. Por que não aplicar percentuais escalonados? — questiona o advogado, que também é assessor jurídico do Sindicato dos Servidores Públicos Aposentados e Pensionistas do Rio Grande do Sul (Sinapers).

Em resposta, a PGE informa que o assunto foi “longamente debatido” e que o deságio igual para todos “é um critério de isonomia, considerado constitucional pelo STF”.

— Entendemos as dificuldades dos credores, mas foi a opção que se fez. O Estado vive sérias dificuldades financeiras, e o estoque da dívida é monstruoso. Por enquanto, não há perspectiva de alterações — afirma Skrsypcsak.

A espera continua

Estrada atravessou propriedades entre Garibaldi e Carlos Barbosa, na Serra, e até hoje donos esperam indenizaçãoFoto: Diego Vara / Agencia RBS

Não será dessa vez que as famílias Gobbo, Gobatto e Manica receberão o pagamento que esperam do Estado há décadas. Eles foram retratados por ZH na reportagem Uma longa espera, publicada em outubro de 2015, e não estão na lista de convocados para eventual conciliação.

Há três décadas, tiveram as terras partidas pela Rota do Sol, entre Garibaldi e Carlos Barbosa, na Serra, e aguardam indenização. Mais de um ano se passou, e eles ocupam posições que variam do número 51 ao 746 na fila. Mesmo assim, mantêm a esperança.

— Fazer o que, né? Só espero ver a cor do dinheiro antes de morrer — diz Sadi Domingos Gobatto, 78 anos.

O QUE SÃO PRECATÓRIOS

São dívidas do poder público resultantes de ações judiciais superiores a 10 salários mínimos (R$ 8,8 mil). No caso do Rio Grande do Sul, decorrem principalmente de questões salariais (envolvendo servidores ativos, inativos e pensionistas), desapropriações e cobranças indevidas de impostos.

COMO FUNCIONA O PAGAMENTO

1) Por ordem cronológica

A quitação é feita pela ordem de apresentação do título, isto é, do mais antigo ao mais novo. Os credores idosos ou com doenças graves podem pedir o pagamento de parcela preferencial. Chamada de “superpreferência”, essa parcela tem valor de até 120 salários mínimos e se relaciona a precatórios de natureza alimentar (casos envolvendo pensões e salários, por exemplo).

2) Por meio de conciliação

O pagamento se dá via acordo, com redução de 40% no valor atualizado dos títulos, deduzidos os descontos legais. A modalidade começou em 2015, com a Câmara de Conciliação de Precatórios. Os titulares são chamados na ordem cronológica para avaliar proposta da Procuradoria-Geral do Estado (PGE). Podem aceitar ou permanecer na fila, à espera do valor integral.

OS ACORDOS

Até agora, a Câmara de Conciliação fez três convocações para negociar acordos, com precatórios do Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional do Trabalho. Confira os dados da PGE

1ª rodada – novembro de 2015
Convocados: 77 precatórios (de 1987 a 1999)
Resultado: 26 acordos firmados, sendo pagos R$ 28,8 milhões (com 40% de deságio)

2ª rodada – junho de 2016
Convocados: 184 precatórios (de 1987 a 1999)
Resultado: 41 acordos firmados, sendo pagos R$ 6 milhões (com 40% de deságio)

3ª rodada – outubro de 2016
Convocados: 1.033 precatórios (de 1987 a 2001)
Resultado: o processo está em andamento.

Saiba mais sobre a 3ª rodada
– Ao todo, os precatórios da terceira rodada representam R$ 600 milhões e equivalem a 5,1% do total devido pelo Estado.
– Se todos os credores decidirem fechar acordo — o deságio é de 40% —, o montante poderá ser reduzido em R$ 240 milhões.
– O prazo para manifestação de interesse termina no dia sete de novembro, próxima segunda-feira. Até agora, mais de 300 credores responderam à convocação.
– As primeiras audiências estão previstas para os dias 1º e 2 de dezembro.

Para mais informações
Acesse o site da PGE e clique no link “Câmara de Conciliação de Precatórios”, à esquerda na página, abaixo de “Serviços”.
Para conferir a lista de convocados, é só clicar em “quero conciliar!”. Ali você também encontrará o formulário online a ser preenchido para manifestar interesse na conciliação.

Leia, abaixo, o especial sobre os precatórios:

Foto: Reprodução / ZH