GAES: Facção da Capital estaria ameaçando agentes

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No mesmo dia, em Brasília, o ministro da Justiça,Alexandre de Moraes, criou uma força-tarefa prisional

No mesmo dia em que o ministro da Justiça e Cidadania, Alexandre de Moraes, assinava a portaria criando a Força-tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP), agentes do Grupo de Ações Especiais (Gaes), da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) afirmavam estar sofrendo ameaças via redes sociais de uma facção de Porto Alegre. O motivo, de acordo com um agente do Gaes, que preferiu o anonimato, estaria ligado às ações desenvolvidas pela unidade nos presídios do Estado. As ameaças, de acordo com o agente, são diretas. Algumas indicam locais onde os integrantes do Gaes ou seus parentes podem ser encontrados. “Todos os agentes estão tomando um cuidado extremo quando saem de casa”, disse o agente penitenciá- rio. “Mas, não vamos permitir que o sistema prisional seja dominado pelos detentos”. A portaria assinada por Moraes atendeu aos pedidos dos governadores de alguns estados, no sentido de auxílio para a questão penitenciária. A Força tarefa será formada por agentes penitenciários federais, estaduais e do Distrito Federal. O grupo atuará em apoio aos governos estaduais em situações extraordinárias de crise no sistema carcerário, para controlar distúrbios e resolver outros problemas.

ATIVIDADES.

Compete à Força tarefa atividades de serviço de guarda, vigilância e custódia de presidiários. A composição da FTIP será na forma dos Acordos e Convênios de Cooperação Federativa da Força Nacional de Segurança Pública celebrados com os estados e o DF. O Ministério do Planejamento autorizou ontem a contratação de 386 aprovados no concurso que o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) realizou em 2015 para contratar agentes federais de execução penal.

Não há facções de fora atuando no RS, esclarece juiz

Magistrado alertou, no entanto, para problemas crônicos do sistema penitenciário gaúcho

Não há facções de fora atuando no Rio Grande do Sul, esclarece juiz. Foto: Sidinei Brzuska / Facebook / CP
Não há facções de fora atuando no Rio Grande do Sul, esclarece juiz. Foto: Sidinei Brzuska / Facebook / CP

O juiz da Vara Execuções Criminais de Porto Alegre, Sidinei Brzuska, concedeu entrevista à Rádio Guaíba na manhã desta quarta-feira para falar sobre as condições do sistema penitenciário gaúcho. Para o magistrado, as recentes rebeliões registradas no Amazonas e no Rio Grande do Norte não devem se espalhar para o território gaúcho porque o Rio Grande do Sul conta com facções que têm vida própria e não precisariam de ajuda externa para ganhar notoriedade. No entanto, ele recomendou que o poder público se mantenha atento aos problemas crônicos das casas prisionais.

“Não há no Rio Grande do Sul um território que seja dominado por uma facção que não tenha sido concebida no nosso Estado. O conflito que está se estabelecendo começou no Norte, Nordeste e o que se percebe é que a disputa envolve grupos do Rio de Janeiro e de São Paulo, que têm interesse nas rotas de cocaína nas fronteiras. Não é uma coisa muito próxima da gente, mas temos de ficar atentos. Não há como negar que as nossas facções têm contato com outros estados, mas eles não precisam de ajuda externa”, afirmou Brzuska.

O juiz explicou que há no Estado grupos estabelecidos há mais de 20 anos e que têm um comportamento diferente das organizações mais novas. “As facções emergentes procuram reconhecimento via imprensa e a partir disso passam a exigir mais espaços dentro das prisões. Para conseguir isso, eles podem aceitar ajudas externas para fazer frente a grupos rivais que já estão estabelecidos. Quando os mais jovens tiram fotos com fuzis e pistolas e colocam nas redes sociais, eles buscam reconhecimento. Os mais velhos não fazem e não querem isso”, acrescentou.

Impacto com o Central 

Antes de chegar a Porto Alegre, em 2008, Brzuska trabalhou com presídios em Santo Ângelo e foi parar na Capital a partir de uma decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que determinou que juízes deveriam fiscalizar penitenciárias mensalmente. A decisão foi tomada depois que uma magistrada do Pará manteve presa por 26 dias uma adolescente em uma cela masculina com 30 homens.

“Por ter experiência com a Vara de Execuções, o Tribunal de Justiça precisava de alguém que fizesse as avaliações das penitenciárias. Acabei entrando no Presídio Central nessa qualidade e nesta época ainda estava em funcionamento a terceira galeria do pavilhão C. Foi este local que rendeu ao Central o título de pior presídio do Brasil. E isso colou de tal forma que não se consegue tirar”, argumentou.

Brzuska recordou que o quadro encontrado no pavilhão C era de “guerra”. “Eu vi uma cena dentro desse pavilhão que nunca vou esquecer. Parecia coisa de filme, algo semelhante ao que vemos na Síria. Agora a galeria não existe mais e antes de ser ocupada foi demolida. Do ponto de vista da destruição, não existe mais algo como aquilo, mas claro que as galerias não são boas. A deterioração do local é tamanha que fica mais barato demolir e construir outra. Há muitos anos que não é feito nada e as celas passaram a ser conservadas a partir do nascimento das facções. O grupo entende que aquele local agora é dele e por isso tenta conservar”, observou.

Cimento: um bem precioso

Por conta da deterioração das celas e das galerias, o Presídio Central passou a ser um bom lugar para esconder drogas, armas e celulares, segundo Brzuska. “As paredes têm infiltração e então por isso fica fácil quebrar para guardar todos esses itens em paredes e no piso. Quando vem a revista, a polícia não encontra nada. Exatamente por isso o cimento se tornou um bem precioso dentro do Central”, afirmou. Brzuska contou ainda que os sacos de leite da cozinha eram trocados por de cimento. “Dez ou 12 quilos de cimento eram vendidos por R$ 1,5 mil”, completou.

Mais prisão, menos recuperação 

Para analisar as condições do sistema penitenciário gaúcho, Brzuska voltou no tempo e relembrou uma época em que o índice de presos no Rio Grande do Sul era mais aceitável. “Se pegarmos os dados do Estado, há 12 anos tínhamos 130 presos para cada 100 mil habitantes. Hoje, se contarmos as pessoas que estão soltas por falta de vagas, nós temos 370 para cada 100 mil pessoas. Fica claro que prendemos bastante e que a nossa Justiça é dura”, enfatizou.

Segundo o juiz, nas audiências de custódia a taxa de soltura é de 14%, ou seja, a cada 100 pessoas detidas, 86 permanecem presas. “A nossa Justiça solta, mas não tanto quanto se imagina. Se fosse assim, não teríamos presos em delegacias e até em lixeiras”, salientou.

Sem apresentar números atualizados, Brzuska comentou que a taxa de retorno de presos para a criminalidade é alta e reclamou da passividade do poder público. “O índice é alto e parece que nos conformamos com isso, mas na realidade isso é um serviço público que estamos dando ao Rio Grande do Sul. A pessoa entra e sai das prisões e só fica depois que comete um crime maior. Nós nunca nos preocupamos com a taxa de retorno e as condições que temos hoje nos presídios daqui tornam praticamente impossível recuperar alguém ou desenvolver um planejamento para tanto”, destacou.

Portaria que cria força-tarefa para intervir em presídios é publicada no DOU

Pelo RS, somente um agente da Susepe irá representar junto à Secretaria Nacional de Segurança Pública

Uma portaria autorizando a elaboração de uma Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária, no âmbito da Força Nacional de Segurança, foi publicada hoje no Diário Oficial da União. A medida para auxiliar governos estaduais que passam por graves crises no sistema penitenciário nos últimos meses foi assinada ontem pelo ministro da Justiça e Cidadania, Alexandre de Moraes.

Segundo a portaria, a força-tarefa de intervenção será composta por agentes penitenciários federais, estaduais e do Distrito Federal, através de acordos e convenções de cooperação federativa da Força Nacional celebrados com os estados e o DF.

Aos agentes penitenciários irão competir os serviços de guarda, vigilância e custódia de presos. O número de profissionais a ser disponibilizado pelo Ministério da Justiça obedecerá ao planejamento definido pelos entes envolvidos na operação.

Segundo o Ministério da Justiça, 78 agentes penitenciários que integram a força-tarefa foram deslocados para o Rio Grande do Norte, em função da morte de 26 presos que foram assassinados em brigas de facções na Penitenciária Estadual de Alcaçuz, localizada na região metropolitana de Natal. Dos 78 agentes, 30 são do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e os outros 48 foram cedidos pelo Distrito Federal e pelos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Ceará.

O Ministério da Justiça afirma que, como ocorre com a Força Nacional, os salários dos agentes penitenciários são de responsabilidade dos órgãos de origem e o Ministério fica responsável pelas despesas de deslocamento e diárias enquanto a força-tarefa estiver disponível.

A assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança Pública ainda não sabe informar se algum auxílio do governo federal foi solicitado ao Rio Grande do Sul. Pela Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), porém, será enviado somente um agente à Secretaria Nacional de Segurança Pública.

CORREIO DO POVO