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ZERO HORA: O que prevê o regime de recuperação fiscal

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Piratini trata o acordo como uma das principais alternativas no enfrentamento da crise

A Assembleia Legislativa vota, nesta semana, a autorização para o Rio Grande do Sul aderir ao regime de recuperação fiscal da União e o fim da exigência de plebiscito para vender as estatais CEEE, Sulgás e CRM. O Piratini tentou votar o tema no fim do ano passado, antes do início do recesso, mas a oposição conseguiu obstruir a sessão – retirando quórum sucessivamente.

Às vésperas da nova votação, o governo apela aos deputados. Em entrevista a GaúchaZH, o governador José Ivo Sartori citou “caos” e “situação anômala” em caso de derrota no Legislativo. Já o chefe da Casa Civil, Fábio Branco, afirmou que um viés na Assembleia levaria ao colapso financeiro do Estado.

— Temos dois caminhos. Um deles é a adesão ao regime. O outro é o caminho do colapso, não só financeiro, mas do serviço público — disse.

AS PROPOSTAS

O governo pretende levar à votação nesta semana quatro textos:

Acordo com a União

projeto de lei complementar (PLC) nº 249 de 2017 pede autorização da Assembleia para o Estado aderir ao regime de recuperação fiscal proposto pelo governo federal.

Dispensa de plebiscito para venda de estatais

Sulgás: A proposta de emenda à Constituição (PEC) nº 266 de 2017 elimina a exigência de plebiscito para federalizar ou privatizar a Sulgás. Com a venda, o Estado espera obter R$ 440 milhões.

CRM: A PEC nº 267 de 2017 dispensa plebiscito para federalizar ou privatizar a Companhia Riograndense de Mineração (CRM). O Palácio Piratini estima que a venda gera R$ 160 milhões.

CEEE: A PEC nº 268 de 2017 acaba com a obrigatoriedade de plebiscito para federalizar ou privatizar a CEEE. O Estado calcula que irá arrecadar R$ 1,6 bilhão com a operação.

PERGUNTAS E RESPOSTAS

O que é o regime de recuperação fiscal?

Alternativa criada pela União para socorrer Estados em calamidade financeira em troca de contrapartidas. Os benefícios incluem carência no pagamento da dívida por três anos (prorrogáveis por mais três) e autorização para novos financiamentos.

Quais são as principais contrapartidas exigidas? 

1) Privatização de empresas dos setores financeiro, de energia e de saneamento, entre outros, para a quitação de passivos.

2) Oferta de ativos como garantia para novos financiamentos.

3) Congelamento de salários de servidores e proibição de contratação de novos funcionários.

O que o governo do Estado busca com o acordo?

Carência no pagamento da dívida por pelo menos três anos, o que significará fôlego ao caixa de cerca de R$ 3,5 bilhões ao ano, e aval para novo financiamento. As parcelas da dívida estão suspensas, atualmente, por decisão liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), mas a medida tende a cair se o acordo não for selado.

Por que há resistências à adesão ao regime?

Os valores que não forem pagos à União não serão perdoados, ou seja, terão de ser honrados de qualquer forma no futuro. Só que, ao final do período de carência, a soma pendente será maior por causa da incidência de juros e correção. O custo disso, segundo a Secretaria da Fazenda, será de R$ 1 bilhão. Outro ponto negativo decorre dos novos empréstimos previstos, que acabarão aumentando a dívida com instituições financeiras. Há, também, críticas em relação às contrapartidas exigidas, consideradas excessivas, e ao fato de que o regime não solucionará a crise em definitivo.

Quais são os argumentos de Sartori?

O governo reconhece que não é o melhor negócio, mas diz se tratar da única alternativa imediata para amenizar a crise. Conforme o Piratini, o custo da adesão (juro e correção da dívida) sairá “mais barato” do que o custo anual dos juros cobrados pelo uso dos depósitos judiciais para cobrir déficits (de R$ 960 milhões por ano). O Estado afirma ainda que, se for obrigado a voltar a pagar a dívida (em torno de R$ 280 milhões por mês), poderá entrar em colapso, atrasando ainda mais os pagamentos de salários e fornecedores, levando a uma bola de neve.

Por que a aprovação dos projetos na Assembleia é importante para o governo?

A lei federal que criou o regime de recuperação fiscal exige que a adesão dos Estados seja aprovada pelos Legislativos estaduais. Sem isso, é impossível fechar acordo. Quanto ao fim do plebiscito para vender as estatais, é a forma que o governo encontrou para acelerar o processo e, assim, cumprir uma das contrapartidas exigidas.

Em que ponto estão as negociações com a União?

Em novembro de 2017, o Piratini apresentou ao governo federal um plano de recuperação fiscal especificando medidas de contenção que o Estado promete cumprir nos próximos três anos. Em 20 de dezembro, o governador José Ivo Sartori e o presidente Michel Temer assinaram “protocolo de acordo”, primeiro passo para a adesão. Agora, o Sartori depende da Assembleia para levar as tratativas adiante.

O PLANO DE RECUPERAÇÃO FISCAL

Confira os principais pontos do plano apresentado à União

1) Freio no custeio da máquina

– Salários dos servidores estaduais não receberão reajustes além da reposição da inflação até 2020 (com exceção dos aumentos da segurança pública, assegurados até 2018).

– Não serão criados cargos ou funções nem haverá alteração de planos de carreira que resultem em aumento de despesa nesse período.

– Contratações serão congeladas, exceto para a reposição de aposentadorias em áreas essenciais como saúde, segurança e educação.

2) Manutenção de ICMS mais alto

– Prorrogação do aumento das alíquotas do ICMS, aprovado em 2015 e válido até 2018. Segundo o governo, a manutenção dos atuais índices a partir de 2019 pode representar receita de R$ 12,6 bilhões até 2023.

3) Maior rigor sobre pensões

– Uma das mudanças prometidas é o fim das pensões vitalícias para cônjuges com idade inferior a 44 anos.

– Outra medida é a necessidade de comprovação, pelos pensionistas, de pelo menos dois anos de união estável para ter o benefício em caso de morte do titular.

4) Corte nos benefícios a empresas

– Redução de 10% no volume de isenções fiscais do Estado.

5) Fim do uso dos depósitos judiciais

– Usados pelo Estado como espécie de “empréstimo” para cobrir déficits desde 2004, os depósitos judiciais não poderão mais ser utilizados. Esses recursos pertencem a pessoas e empresas em litígio na Justiça e ficam depositados em uma conta do Judiciário até o fim dos processos, como garantia para o cumprimento das sentenças.

6) Oferta de ativos

– Os dividendos que o Estado recebe do Banrisul, de cerca de R$ 150 milhões por ano, serão oferecidos como ativos à União para viabilizar a obtenção de novo empréstimo.

O que está em jogo com a votação do regime de recuperação fiscal

Nesta semana, deputados irão votar autorização para o RS aderir ao regime de recuperação fiscal da União e o fim da exigência de plebiscito para vender três estatais

Com parcelamentos salariais consecutivos desde fevereiro de 2016, o governo de José Ivo Sartori prevê o “colapso” das finanças públicas se não conseguir aderir ao regime de recuperação fiscal proposto pelo Palácio do Planalto. A autorização para a adesão será votada nesta semana pela Assembleia – junto com as propostas sobre o fim da exigência de plebiscito para vender as estatais CEEE, Sulgás e CRM.

Caso se concretize, a adesão ao regime fiscal garantirá aval para novos empréstimos e pelo menos três anos de carência na dívida com a União, um fôlego de mais de R$ 10 bilhões ao caixa – equivalente a seis folhas de pagamento do Executivo.

Apesar de amenizar as dificuldades, o dinheiro não resolve o problema, inclusive porque que terá de ser pago no futuro, com juros e correção. A cúpula do Piratini reconhece, mas diz não ter alternativa no curto prazo e teme que uma eventual derrota na Assembleia provoque efeito colateral indesejado.

Em agosto de 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu liminar antecipando provisoriamente asuspensão do pagamento da dívida pelo Estado, mas a decisão pode ser revertida se a assinatura do acordo não sair.

— Temos dois caminhos. Um deles é a adesão ao regime. O outro é o caminho do colapso, não só financeiro, mas do serviço público — advertiu o chefe da Casa Civil, Fábio Branco, em entrevista à Rádio Gaúcha na sexta-feira (26).

Para economistas, acordo é ruim, mas não há saída

Embora considerem a medida limitada, com exigências duras e incapaz de solucionar a crise do Estado, economistas ouvidos por GaúchaZH afirmam que a situação pode piorar sem a assinatura do acordo. Especialista em finanças públicas, Darcy Carvalho dos Santos confirma as projeções sombrias de Branco, mas também aponta problemas na saída que está em debate, não por acaso alvo de polêmica e de resistência.

— É uma saia justa. A verdade é que o negócio não é bom, mas, se o governo não aderir, a situação vai ficar pior. A liminar da dívida vai cair, e o Estado terá de pagar os valores pendentes e ainda honrar as parcelas atuais. Serão R$ 6 bilhões de déficit em 2018 (o equivalente a quatro folhas de pagamento do Executivo). O governo não tem de onde tirar isso — afirma Santos.

Uma das consequências, na avaliação do economista Liderau dos Santos Marques Junior, da Fundação de Economia e Estatística (FEE), serão atrasos ainda maiores no pagamento de compromissos, incluindo os salários dos servidores.

Temos dois caminhos. Um deles é a adesão ao regime. O outro é o caminho do colapso.

FÁBIO BRANCO

Chefe da Casa Civil

— O regime de recuperação é limitado, não mexe com questões estruturais e vai amenizar a crise apenas no curto prazo, mas é a saída possível no momento — pontua Marques.

Professor de Economia da PUCRS, Alfredo Meneghetti Neto diz que, sem o socorro federal, o Piratini terá de torcer pela recuperação econômica para alavancar a arrecadação, mas “não será suficiente”. Meneghetti defende que Sartori reforce a pressão sobre o governo federal em busca de créditos pendentes aos quais o Estado tem direito:

— As perdas da Lei Kandir são um exemplo disso. Não tenho dúvidas de que é preciso ir atrás dessas verbas. Não podemos esquecer que 2018 é ano eleitoral, ou seja, ano de bondades. O Rio Grande do Sul tem de tirar proveito disso.