Numa tarde de setembro, pouco após uma operação do Batalhão de Operações Especiais (Bope) no Morro do São Carlos, o clima permanecia tenso na comunidade. Baseado num dos pontos mais perigosos da favela, o soldado Marcus Vinicius da Silva Pavão, de 28 anos, viu um barbeiro, preocupado com a insegurança, negar-se a atender uma criança. Cabeleireiro de formação, o policial não pensou duas vezes: pegou uma máquina e rapou fora ele mesmo as madeixas do menino. Só naquele dia, foram nove cortes gratuitos para os moradores — aparando também, de quebra, um pouco da atmosfera de apreensão.
— Isso é a essência do nosso trabalho. Ele teve uma ótima sacada, foi proativo. Dou valor a esse tipo de iniciativa — elogia o major Márcio Rodrigues, comandante da UPP São Carlos.
Foi uma outra imagem, porém, que colocou o rosto do soldado Pavão em diversos grupos de policiais nas redes sociais nos últimos dias. Viralizada, a foto mostra o PM, fardado, fazendo escova em uma colega de tropa.
— Foi uns dias após atender a molecada. Aproveitei a hora do almoço e brinquei com elas que era para não dizerem que só faço o cabelo do pessoal da comunidade — conta o soldado.
Acompanhando a foto do corte na colega, um áudio falsamente atribuído ao policial, informando que ele seria lotado no 18º BPM (Jacarepaguá), também vem circulando na internet. Em vez se aborrecer, Marcus Vinicius aproveita para cortar fora o preconceito:
— Meu único receio com a gravação era ser acusado de insubordinação, ou algo assim. Mas não tenho o menor problema com isso, mesmo porque passei muito tempo no meio e aprendi a conviver com todo mundo. A pessoa achou que iria me sacanear e quebrou a cara.
Casado e pai de dois filhos, o hoje soldado começou a trabalhar no salão da irmã aos 15 anos. Depois, aperfeiçoou-se na área por uma década, com o currículo recheado de cursos e passagens por estabelecimentos de alto nível. A opção pela carreira na PM veio há quatro anos, em busca de estabilidade.
— Tudo o que tenho ganhei trabalhando com beleza. Sou um profissional de cabelo, sim, e também de segurança pública. Se tiver combate, vou para o combate, mas não é só de tiro que o morro vive — ensina.
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