

Foto: Roni Rigon / Agencia RBS
Mesmo em dificuldades, programa que aproxima brigadianos dos bairros é aprovado pela comunidade
PIONEIRO
Diante do impasse na parceria entre a prefeitura de Caxias do Sul e o Governo do Estado que colocou em dúvida a continuidade do policiamento comunitário da Brigada Militar (BM), o Pioneiro apresenta uma série de reportagens para mostrar como está o programa que teve o projeto-piloto lançado na cidade há cinco anos e apostava na aproximação entre policiais e moradores para reduzir a criminalidade.
Até terça-feira, o leitor poderá entender como a estratégia, que já foi exemplo para o Estado, está sendo prejudicada pela diminuição do efetivo policial ao longo dos anos e não está conseguindo cumprir os objetivos na maioria dos bairros. Ainda assim, a iniciativa mantém ampla aprovação popular e é apontada como o primeiro passo para uma cidade mais segura.
Levantamento da reportagem (gráfico abaixo) mostra que apenas nove dos 24 núcleos de policiamento comunitário funcionam plenamente e realizam o trabalho preventivo em bairros e loteamentos de Caxias. A mesma pesquisa junto aos líderes comunitários aponta que o programa deveria receber mais atenção do Poder Público.

Para as lideranças, o policiamento comunitário teve um impacto imediato em 2012, quando o município recebeu o projeto-piloto da Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP). Contudo, perdeu força conforme diminuiu o número de PMs na cidade. Com mais crimes e menos efetivo, os policiais comunitários foram obrigados a se afastar de seus núcleos para atender ocorrências que necessitam de uma resposta imediata em outras partes da cidade, junto ao policiamento ostensivo. Com isso, as comunidades perderam a referência que tinham com os policiais militares.
Contudo, a maioria dos moradores compreende as dificuldades da BM e evita criticar o programa com o receio de que gestores públicos usem isso como argumento para encerrar a iniciativa. Ou seja, se no presente ainda não é possível contar plenamente com PMs atuando e residindo nos bairros, as comunidades defendem que esse seja o cenário do futuro.
Falta de diálogo entre prefeitura e Estado preocupa
Não é coincidência que quanto menos os policiais gaúchos são vistos nas ruas, mais a criminalidade avança. A falta de brigadianos é um dos pontos centrais da crise na segurança pública no Rio Grande do Sul. Desta forma, é fácil entender o apelo popular do policiamento comunitário em Caxias do Sul. Ter policiais conhecidos do bairro, que ouvem os moradores e circulam pelas principais ruas trazem lembranças de uma época em que grades não eram um item de segurança obrigatório nas residências.
A popularidade do programa, inclusive, parece ser a explicação para que o governo estadual e prefeitura evitem críticas públicas. Nos bastidores, no entanto, as administrações do governador José Ivo Sartori (PMDB) e o prefeito Daniel Guerra (PRB) resistem em encontrar soluções para manter e ampliar o projeto. Essa falta de ação resultou no fim de um dos três convênios do policiamento comunitário no dia 17 de setembro, gerando incertezas sobre o futuro do programa em Caxias.
Sem a renovação do contrato, 36 PMs deixaram de receber o auxílio-moradia e 16 localidades foram prejudicadas. O comando do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM) garante o trabalho mesmo sem o apoio financeiro. Contudo, os policiais participantes não são mais obrigados a residir nos bairros de atuação – um dos pilares do programa. O impacto do fim do convênio, no entanto, só deverá ser percebido a partir do próximo mês.
Conhecer a rotina do interior fez a diferença no policiamento em Caxias do Sul
Policiais comunitários diminuíram a sensação de abandono na zona rural

Se na zona urbana conhecer os moradores auxilia na segurança do bairro, no interior isso é uma necessidade. O policiamento comunitário na área rural talvez seja o melhor exemplo em Caxias do Sul da integração proposta pelo programa. Acostumados com a distância dos serviços disponíveis na cidade, os moradores do interior de Caxias exaltam o convívio dos brigadianos e fazem questão de oferecer pelo menos um café aos policiais durante as visitas.
Por outro lado, morar afastado da zona urbana é um teste do comprometimento do PM comunitário, o que resulta em uma melhor atuação. Mesmo com o auxílio-moradia, a maioria dos brigadianos não quer morar em distritos e localidades afastadas e o comando tem dificuldades para encontrar candidatos ao posto.
Historicamente, as rondas policiais não chegam à zona rural devido à distância do batalhão da Brigada Militar, que fica no bairro Kayser. No passado, mesmo quando vítimas de crime acionavam o 190, raramente uma viatura era deslocada até um distrito porque havia o entendimento de que os bandidos já haviam deixado a propriedade e os reféns não estariam em risco. Essa fragilidade foi percebida pelos ladrões e os relatos de crimes viraram parte da rotina, principalmente no início dos anos 2010.
— O pior é que (os criminosos) são agressivos. Não aceitam que (as vítimas) não tenham nada. Eles batem nas pessoas e quebram tudo. A gente vivia se escondendo e se defendendo como podia — relata Solimar Daneluz, 59 anos, morador de Vila Oliva há 30 anos.
Felizmente, o policiamento comunitário afastou a sensação de abandono sentida pelos moradores. A equipe do interior usa uma caminhonete para percorrer 300 quilômetros todos os dias e conversar com agricultores e famílias de locais afastados.
— Buscamos orientar a comunidade, principalmente em casos de emergência, e estimular que eles nos abordem. Os moradores têm que conhecer o policial que atende a localidade. Conhecer a rotina do interior faz a diferença no nosso trabalho — explica soldado Weide.

Diante de uma movimentação suspeita, os moradores são instruídos a anotar o modelo e placa do veículo e acionar os policiais. A resposta é mais rápida porque, além de estarem mais próximos, os brigadianos conhecem pontos de referência e os nomes das fazendas.
— Eles estão sempre em contato conosco e circulando pela região, o que passa esse ar de segurança. O próprio bandido se retrai (ao avistar os PMs). Sabemos que não vai resolver 100%, mas ajuda e é muito importante para nós — comenta Daneluz.
Ao conversar com os moradores, é fácil concluir que o policiamento comunitário funciona no interior e melhorou a segurança, embora muitas comunidades reclamem de assaltos. No entanto, como ocorre na cidade, o programa não opera plenamente. O convênio previa a participação de 11 policiais militares em três núcleos: Vila Seca, Fazenda Souza e Forqueta. Atualmente, há um brigadiano para o setor administrativo e seis para atuar nas rondas, sendo que dois estão de licença. Desta forma, o trabalho ficou dividido em duas duplas, que se revezam no patrulhamento de 2,1 mil quilômetros.