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Oficiais da Capital expõem fragilidade da corporação em atender incêndios de grande proporção

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Oficiais da Capital expõem fragilidade da corporação em atender incêndios de grande proporção

16222096Incêndio que destruiu loja na noite de terça-feira, em Porto Alegre, expôs precariedade da corporação 

As precariedades — e os nervos — do Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul ficaram expostas mais uma vez. O incêndio em uma empresa na zona norte de Porto Alegre — que durou cerca de seis horas até o rescaldo em uma luta contra o tempo para evitar que as chamas atingissem quatro bombas de combustíveis dentro de uma empresa de ônibus — foi mais um exemplo da fragilidade estrutural da corporação para combater o fogo.

O desabafo do major Rodrigo Dutra (leia abaixo), subcomandante da corporação em Porto Alegre e responsável pela área operacional na região, revela um quadro preocupante. Colegas de farda também relataram percalços do cotidiano que envergonham os bombeiros. A existência de apenas uma autoescada, a inexistência de caminhões-pipa, falha nos radiocomunicadores e só uma viatura para cada um dos oito batalhões, quando o necessário seria o dobro, mostra que a realidade pouco mudou desde o incêndio do Mercado Público, em julho passado. O déficit é de quase 600 homens, no mínimo. Hoje a Capital tem 230 bombeiros.


Nesta semana foi definida a abertura de licitação para a compra de equipamentos para 2014 por meio do Fundo de Reequipamento do Corpo de Bombeiros (Funrebom), com verba de R$ 2 milhões. Entre os materiais, está prevista a aquisição de uma ferramenta fundamental: o oxi-explosímetro, que permite entrar em ambiente confinado com vazamento de gás. Ontem, os bombeiros de Porto Alegre encaminharam ao comando da Brigada Militar uma lista com as necessidades no total de R$ 16 milhões, incluindo três viaturas com autoescada mecânica ou plataforma.

Comandante dos bombeiros da Capital, o tenente-coronel Adriano Krukoski afirma que, desde 1998, a corporação não recebe viaturas do Estado. Segundo o comandante-geral dos Bombeiros, coronel Evilton Pereira Diaz, o último investimento do governo do Estado em viaturas para Porto Alegre ocorreu em agosto de 2013, quando foram comprados três caminhões de combate a incêndio.

Ele afirma que a previsão, entre custeio e investimento, é de R$ 13 milhões para 2014. Já foram licitados seis caminhões de bombeiros para esse ano. Nenhum para Porto Alegre. O coronel afirma que o Centro de Comunicações da Brigada está averiguando falhas nos radiocomunicadores.

O comandante sustenta que a corporação tem feito esforços para ampliar o contingente, incluindo a contratação de 600 homens ao efetivo em 2013. Este ano, já foi publicado o edital para a inclusão de mais 400 bombeiros. Atualmente, a defasagem de pessoal é de 40%. Há 2,6 mil bombeiros no Estado, mas deveria haver cerca de 4,3 mil.

A Secretaria da Segurança Pública foi procurada para falar sobre investimentos, mas disse que não cabe a ela falar sobre isto. ZH também tentou contato com a Brigada Militar, que designou o coronel Evilton para falar sobre o assunto.

O desabafo de quem está na linha de frente

Ao relatar em ordem cronológica as providências e dificuldades para combater o incêndio na noite de terça-feira, o subcomandante do Corpo de Bombeiros de Porto Alegre, major Rodrigo Dutra, expõe a precariedade de estrutura, como carência de caminhão-pipa e caminhões de combate a incêndio e sistema de radiocomunicação ineficiente.

19:30

“Em meio à reunião com a diretoria do Inter (de liberação do estádio para o jogo de ontem), ouço no rádio o código 66, referente a apoio (pedido de socorro). Diziam que era perto do DC Navegantes e que era de grandes proporções. Como comandei a operação do Mercado Público aqui em Porto Alegre, pensei na hora: ‘Isso não vai dar certo’. Abandonei a reunião.”

19:32

“Entrei na viatura. Ligamos a sirene e saímos a toda. Pelo rádio tentava me informar do que estava acontecendo, e nada. Vamos para o celular. Há na mesa do 193, o atendente do Ciosp, dois telefones, um que recebe chamadas administrativas e outro, a ligação de emergência, com uma pessoa atendendo cada um. Não consegui falar com os caras. O sistema de rádio ora funciona, ora não funciona.”

19:50

“Chegando lá, começa o calvário da ocorrência. O controle do incêndio principal estava focado na proteção do shopping. Nenhuma equipe conseguia romper os portões de ferro que davam acesso à zona entre a empresa (Ouro e Prata) e o shopping. Precisaríamos entrar lá. O objetivo era conter a propagação. Vi um sargento tentando pular o portão e caindo no chão por causa de um choque elétrico. Não tinha desencarcerador (espécie de macaco hidráulico capaz de abrir portões de ferro). Em um incêndio, tu jogas contra o tempo.

19:55

“Pedi que um caminhão de bombeiros tentasse entrar de ré e botar o portão abaixo. Passa por cima, azar. O fogo estava a 50 metros deste portão. Alguém apareceu com um controle remoto e abriu o portão. E aí começam as dificuldades de ser em uma cidade como Porto Alegre com só oito quartéis e meia dúzia de caminhões velhos.”

20:00

“Estava enlouquecido com o meu rádio tentando comunicar a CEEE para que a energia elétrica fosse desligada no local. Entrei na viatura para pegar o rádio, mas ela não tinha rádio. E os bombeiros combatendo as chamas com o prédio energizado. Avistei uma viatura da Brigada Militar. Peguei o rádio deles e acionei a rede. O oficial que atendeu disse que eu estava acessando a rede do 11º BPM. Eu disse: ‘Eu sei. Só estou querendo tua ajuda para dizer ao coordenador do Ciosp que a rede do Corpo de Bombeiros está inoperante. Aciona a mesa dos bombeiros, que é do teu lado aí, e pede para eles avisarem a CEEE com brevidade para cortar a energia’. Amadorístico total, né? Cidade da Copa.”

20:20

“Não sei de onde vieram, mas dei graças a Deus. Depois fiquei sabendo que eram bombeiros voluntários de Eldorado do Sul e Camaquã, que vieram por conta própria. Não permitimos que entrassem por questões de segurança, mas a água foi a salvação. Depois acionamos empresas privadas que trouxeram caminhões-pipa.”

21:20

“A escada mecânica estava posicionada perto dos quatro tanques de combustíveis, jogando água o tempo todo para evitar que fossem atingidos. Neste meio tempo, voltou a pegar fogo na área da loja. O certo seria ter outra escada mecânica que pudesse ser posicionada ali para combater as chamas, mas não tínhamos.”

21:30

“Novo reposicionamento tático da escada. Se houvesse escadas suficientes, viaturas em condições e caminhões-pipa, nem a metade daquela área teria sido queimada. Imagina o desespero de saber o que tem de ser feito e não ter como fazer.”

Bombeiros da Capital, que pedem para não ser identificados com receio de sofrerem represálias, enumeram as dificuldades de trabalho no dia a dia:

“Alguns EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) estão rasgados e descosturados. Isto nos expõe a risco. O meu é de cinco anos atrás. Mas as roupas não duram muito, pegam fogo na ocorrência. A situação está precária. Já aconteceu de chegar a uma residência, o carro queimando na garagem, e a mangueira não ligar porque a bomba que faz pressão para a saída de água estragou, por exemplo. Eu com vergonha, e o carro todo queimado.”

“Este caminhão que temos não tem segurança nenhuma. É um lixo. Tem problema nos freios. Aí, tu imagina, a gente tem de andar correndo, cortando o trânsito, andar carregando 5 mil litros de água. Às vezes, tem de frear de soco. É perigo para nós e para os outros motoristas. O cara nem pensa muito, meio que confia no colega que está dirigindo.”

“A nossa preocupação é chegar à tua casa, te olhar e dizer: ‘Não tem o que fazer’. A escada que temos vai até o oitavo andar de um prédio. Se tu tiver no nono vai ter de te atirar porque eu não tenho o que fazer para te salvar. Pegamos acidentado preso em uma grade, em que a pessoa ficou espetada e não tinha o material para tirar. Como eu me sinto com isto?”

“Porto Alegre não tem um caminhão-pipa, sempre que dá um incêndio grande desses (o fogo em uma loja na zona norte da Capital, na noite de terça-feira), empresas nos doam voluntariamente os delas. Desta vez, foi assim. Teve uma hora que ficamos de mãos atadas, a mangueira seca porque não tinha água. Aí, dá uma tristeza, né? A gente luta, luta, luta e leva um nocaute técnico.”

Confira mais fotos do local:

Veja o local do incêndio:

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