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“A ideia foi boa, mas a prática não funcionou”, diz comandante do CPC sobre Territórios de Paz

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“A ideia foi boa, mas a prática não funcionou”, diz comandante do CPC sobre Territórios de Paz

SegurançaGoverno admite falhas no projeto e estuda um novo modelo de combate à criminalidade para ser implantado a partir de 2015

Com a dominação de facções criminosas em meio às comunidades de Porto Alegre, a população se questiona por onde anda a segurança pública. A Brigada Militar admite que, em situações de toques de recolher, os moradores acabam reféns dos traficantes. No entanto, a polícia garante que tem total controle sobre as regiões da Capital onde se concentram os maiores índices de criminalidade.

Em entrevista à Rádio Gaúcha, o chefe interino do Comando de Policiamento da Capital (CPC), tenente-coronel José Henrique Botelho admite que o tráfico de drogas é o principal problema de criminalidade em Porto Alegre no atual momento. Botelho, que também é comandante do 21º Batalhão de Polícia Militar (BPM), critica o atual modelo de gestão dos Territórios de Paz e confessa que a configuração do projeto falhou.

Confira a entrevista:

Rádio Gaúcha – O que está sendo feito nas comunidades que são diretamente atingidas pelo domínio de facções ligadas ao tráfico de drogas?

Tenente-coronel José Henrique Botelho- Sempre que nos temos notícia de que em algum lugar de Porto Alegre há uma dominação do trafico de drogas nós sempre procuramos intensificar o policiamento nessas regiões, justamente porque nós sabemos que a questão do tráfico tem uma tendência de deixar as comunidades como reféns dessa atuação criminosa. Não há regiões onde a Brigada Militar não entre em Porto Alegre, e quando entra nós tivemos sucesso em reverter positivamente a ação dos traficantes, para trazer tranquilidade para comunidade novamente.

Rádio Gaúcha– O que os dados da criminalidade podem dizer sobre a influência do tráfico de drogas nos crimes?

Botelho- No ano de 2014, 94% dos homicídios cometidos em Porto Alegre estão relacionados ao tráfico de drogas. 91% das vitimas dos homicídios possuíam antecedentes criminais. Então fica bem evidente que realmente o grande problema instalado não só na Capital, mas no Brasil inteiro, é o tráfico de drogas, pois os homicídios estão totalmente ligados a isso.

Rádio Gaúcha– O senhor acha que o tráfico de drogas é o principal desafio da polícia em Porto Alegre neste momento?

Botelho- Sim, e isso se nota principalmente nesses dados estatísticos. A grande parte dos delitos que são cometidos na Capital não tem só a questão do tráfico, mas também outros crimes que são totalmente ligados a ele como o roubo a pedestres e o furto de veículos. O Brasil hoje não é mais um corredor de passagem de drogas, mas é um grande consumidor de drogas. A criminalidade viu um potencial de consumo e investiu nesse mercado – e até agora está dando certo.

Rádio Gaúcha– Os grupos de tráfico são tão consolidados que, quando um líder é morto, sempre há um substituto. Existe algum meio de acabar com essa cadeia hereditária?

Botelho- A gente tem uma parte de investigação que tenta mapear essas quadrilhas, que são totalmente hierarquizadas. A partir do momento em que um líder é preso ou morto, a tendência é que logo abaixo alguém o substitua, nem que seja temporariamente. Isso só acirra mais a disputa de território entre as facções, que estão sempre acontecendo. E isso é o que traz mais risco para a comunidade.

Rádio Gaúcha– Quantos pontos de tráfico dominados por facções criminosas existem em Porto Alegre hoje?

Botelho- Nós não temos um levantamento específico, mas são vários. O tráfico está bastante disseminado em Porto Alegre. Só para ter uma ideia, eu já tenho 29 anos de serviço na BM. No inicio de 1999, voltei para Porto Alegre e trabalhei no bairro Restinga. Na época a região tinha duas grandes quadrilhas. Quinze anos depois, eu voltei para lá como comandante do 21º Batalhão de Polícia Militar (BPM) e, hoje, tem mais de 23 quadrilhas instaladas na área da Restinga, que vivem em constante tensão e conflito.

Rádio Gaúcha A Restinga e outros três bairros de Porto Alegre possuem os Territórios de Paz, que foram implantados para diminuir a criminalidade nessas regiões. No entanto, houve um aumento no número de homicídios nas localidades que acabou superando os números da Capital inteira. O que deu errado?

Botelho- Os Territórios de Paz foram colocados nesses quatro pontos justamente por serem as piores áreas de Porto Alegre, e mesmo assim aumentou a criminalidade. Se a gente for analisar bem, a metodologia do Território de Paz foi controvérsia. A ideia foi boa, mas a prática não foi tão boa assim. E isso acabou refletindo nas mortes.

Rádio Gaúcha– Que tipos de falhas aconteceram nessa metodologia do Território de Paz?

Botelho- Um dos problemas que foram detectados foi justamente que os Territórios foram instalados de uma forma que a concentração de meios e de recursos humanos e materiais ficaram diretamente ligados à estrutura da Secretaria de Segurança Pública, sem a autonomia dos comandantes dos Batalhões sobre esse projeto. Nessa metodologia, a parte administrativa acabava a cargo dos Batalhões, mas a autonomia operacional era da Secretaria. A SSP que dita a quantidade de viaturas que deveriam ser empregadas diariamente. Então tinha um aporte de viaturas, um aporte de horas extras, um aporte de recursos humanos que acabaram não surtindo efeito na prática.

Rádio Gaúcha– Qual seria o melhor modelo?

Botelho- Eu vou te dizer a realidade… O comandante é somente o “chefe do almoxarifado” nos Territórios de Paz, sem autonomia operacional nenhuma. A SSP que gerencia a região e não o comandante local. Isso deveria ser invertido. Nós estamos lá na comunidade, conhecemos a realidade do local, e sabemos o que precisa ser feito nas horas específicas. A parte administrativa deveria ficar com a SSP e a operacional com os comandantes dos Batalhões.

Rádio Gaúcha- Há algum projeto ou tentativa de mudar essa metodologia dos Territórios de Paz?

Botelho- A Secretaria admitiu que esse modelo é falho e agora está fazendo uma avaliação desse processo. Eles viram que na prática não funcionou e vão tentar aplicar um novo modelo. A SSP está estudando um novo projeto para ver o que vai ser feito daqui para frente. Os Territórios de Paz vão continuar, mas não nessa configuração atual.

Informação confirmada pelo comandante: 

Em entrevista ao Gaúcha Atualidade desta quinta-feira (05), o comando da Brigada Militar confirmou a ideia de rever a situação. O Comandante-Geral da Brigada Militar, Coronel Alfeu Freitas, afirmou que os Territórios de Paz, lançados em setembro de 2011 nos bairros Lomba do Pinheiro, Santa Tereza, Restinga e Rubem Berta continuam respondendo por grande parte dos assassinatos na Capital. Por isso, a Brigada Militar admite que o modelo atual é falho e estuda novas medidas para combater a criminalidade nesses locais.

“Nós estamos juntamente com a Secretaria de Segurança Pública e outros órgãos vinculados revendo e organizando essas ações, no que se refere a essas políticas de segurança, principalmente nesses locais mais conflagrados. Casualmente, alguns dos citados, são Territórios de Paz”, diz o Coronel Alfeu Freitas.

O comandante não descarta implantar modelos de outros Estados, como as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) do Rio de Janeiro, desde que adaptadas para a realidade local.

Rádio Gaúcha