Sindicatos se mobilizam contra pacote de Sartori

03/06/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Entrevista coletiva com Chefe da Casa Civil do RS, Márcio Biolchi, e integrantes da gestão Sartori. Foto: Guilherme Santos/Sul21
03/06/2015 – PORTO ALEGRE, RS, BRASIL – Entrevista coletiva com Chefe da Casa Civil do RS, Márcio Biolchi, e integrantes da gestão Sartori. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Jaqueline Silveira

O pacote do governo José Ivo Sartori (PMDB) encaminhado à Assembleia Legislativa, na última quarta-feira (3), causou descontentamento entre entidades de servidores do Estado. Vários segmentos irão se reunir na próxima segunda-feira (8) para avaliar o conjunto de medidas anunciadas que, segundo o Piratini, têm por objetivo estancar a crise financeira no RS.

Na manhã da próxima segunda-feira (8), a coordenação de servidores, constituída por representantes das principais entidades do funcionalismo estadual, reúne-se, a partir das 9h, na sede do Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas e de Fundações Estaduais do Rio Grande do Sul (Semapi), para avaliar o pacote, chamado pelo governo de “ajuste fiscal gaúcho – fase 2”. O encontro também servirá para preparar o seminário que abordará as finanças do Estado sob a ótica dos servidores, que ocorrerá ainda neste mês. Já pela parte da tarde, a direção do Centro dos Professores do Rio Grande do Sul (Cpers/Sindicato) se reúne às 14h. Quase no mesmo horário, às 14h30, o Sindicato dos Escrivães, Inspetores e investigadores (Ugeirm) faz assembleia. Ainda na tarde de segunda-feira, a Associação dos Cabos e Soldados reunirá a categoria.

O pacote do governo tem 11 projetos, que já tramitam na Assembleia Legislativa, e mais três decretos. Entre as propostas apresentadas, estão a transformação da licença-prêmio em capacitação retirando o caráter indenizatório e o fim da incorporação da função gratificada (FG) nas aposentadorias de servidores que trabalham em outros poderes. Também faz parte das medidas a criação da Lei Estadual de Responsabilidade Fiscal, que veda reajustes parcelados para pagamento dos sucessores e limita em 75% as despesas com custeio e investimento e, em 25%, com a folha de pagamento. Outro projeto prevê o aumento escalonado da alíquota sobre doações e heranças. Além disso, o governo prorrogou por mais 180 dias o decreto que corta gastos com diárias e horas extras e veda nomeações de concursados nesse período. O Piratini estima uma economia de R$ 1,07 bilhão até o final do ano com o decreto.

Presidente do Cpers, Hlenir Schürer, diz que alunos serão prejudicados sem novas nomeações|Foto: Filipe Castilhos/Sul21
Presidente do Cpers, Hlenir Schürer, diz que alunos serão prejudicados sem novas nomeações|Foto: Filipe Castilhos/Sul21

Déficit de professores

Presidente do Cpers/Sindicato, a professora Helenir Aguiar Schürer diz que a prorrogação do decreto é uma das medidas que mais preocupam a entidade, uma vez que já há um déficit de professores e que seriam necessárias novas nomeações, além das já efetivadas. De janeiro a maio de 2015, segundo ela, 1,2 mil professores deixaram o quadro, a maioria por aposentadoria. Dos 540 nomeados, 200 não assumiram a função devido aos baixos salários. Mesmo somados aos 370 contratos em caráter emergencial, apenas 710 novos profissionais assumiram no magistério, número inferior ao déficit registrado só este ano. “Nós entendemos que quem vai pagar esse preço altíssimo é o aluno. Isso é irrecuperável!”, afirmou Helenir.

Nomeações interrompidas

A medida também preocupa o Semapi, que presenta 8 mil servidores estaduais de diversas fundações do Estado. O diretor colegiado do sindicato, Edgar Costa, ressalta que o governo anterior havia iniciado o processo de nomeações de funcionários com o fim de amenizar o déficit da Fundação de Proteção Especial do Rio Grande do Sul (FPE) e da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase), o que agora foi interrompido. Especificamente em relação à Fase, ele disse que foram chamados 300 funcionários na gestão anterior, mas que alguns dos concursados desistiram ou foram reprovados no estágio probatório, necessitando novas nomeações. Sem reposições e com a redução de horas extras para compensar o déficit de funcionários, além de cortes de diárias, conforme Costa, a segurança da Fase está “sendo prejudicada”. “Esse decreto foi muito duro”, avaliou ele. A falta de servidores, de acordo com o diretor, também prejudica o atendimento das crianças na FPE, inclusive para levá-las a consultas médicas.

Segurança vulnerável

As entidades representantes da segurança pública também criticam o fato de o governo barrar as nomeações de concursados,

Presidente da Ugeirm, Isaac Ortiz diz que governo quer restringir reajuste que vai até 2018 Foto: Guilherme Santos/Sul21
Presidente da Ugeirm, Isaac Ortiz diz que governo quer restringir reajuste que vai até 2018 Foto: Guilherme Santos/Sul21

ao mesmo tempo em que há o aumento da criminalidade. A Brigada Militar tem 2 mil brigadianos e 600 bombeiros aguardando serem chamados. Já a Polícia Civil tem 650, entre escrivães e inspetores, aptos a iniciarem a Academia de Polícia. “Estamos preocupados, não conhecemos as reais intenções do governo. É um governo que engessa a segurança. Nós vamos definir ações não só para combater esse pacote, mas definir ações para a área de segurança. Hoje se mata em tudo que é canto”, enfatizou o presidente da Ugeirm, Isaac Ortiz. Ele lembrou que o corte de combustíveis e diárias, além da falta de policiais, consequências do decreto em vigor desde janeiro de 2015, contribuem para deixar a segurança ainda mais vulnerável.

Ortiz criticou também a proposta do governo do Estado de promover o retorno dos policiais militares à corporação para trabalharem em setores administrativos, como no videomonitoramento, liberando mais brigadianos para fazer a segurança nas ruas. O retorno seria por adesão e os policiais ganhariam um abono de permanência de R$ 1.180. “É um absurdo certas coisas”, alfinetou ele, referindo-se ao fato de o governo propor a volta dos policiais, ao invés de chamar os concursados.

11829396Presidente da Associação de Cabos e Soldados, Leonel Lucas disse que essa iniciativa não deve encontrar receptividade entre os PMs. “É muito pouco atrativo”, resumiu ele, sobre o valor do abono, acrescentando que compensa mais os aposentados “fazerem bicos”, que renderia “bem mais”. Atualmente, conforme Lucas, há 1,2 mil policiais inativos trabalhando em escolas, Ministério Público e Poder Judiciário. A maioria está concentrada no MP e na Justiça, ressaltou o presidente, porque esses órgãos pagam melhor que o abono do governo do Estado. Ele disse que há um descontentamento, principalmente, porque o governo não propôs, na visão dos policiais, nenhuma medida para melhorar a segurança pública, ao contrário. “A classe está revoltada”, concluiu Lucas.

Licença-capacitação não agrada

A transformação da licença-prêmio em licença-capacitação também não foi vista com bons olhos pelos sindicatos. Concedida a cada cinco anos e pelo período de três meses, a licença perde seu caráter indenizatório e esse período terá que ser usado especificamente para a qualificação do servidor. Em sua justificativa, o governo argumentou que as despesas com indenização dessas licenças aumentaram “de forma considerável” nos  últimos anos. Como se trata de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), em caso de ser aprovada, a PEC não atingirá só os servidores do governo, mas dos outros poderes do Estado.

A medida, conforme a presidente do Cpers, irá mexer no plano de carreira dos professores. Helenir explicou que a categoria já possui licença-capacitação pelo período de um ano. “Nós vamos perder a licença-prêmio”, lamentou ela. A professora criticou, ainda, a proposta de criação da Câmara Conciliatória de Precatórios, proposta que permite que a Procuradoria-Geral do Estado (PGE), de acordo com a ordem cronológica, negocie essas dívidas concedendo um desconto de 40% do valor total. Na opinião da professora, o funcionalismo “sairá perdendo 40%” e os servidores não podem ser penalizados por uma “dívida histórica” do Estado. No dia 26 de junho, o pacote será uma das pautas da assembleia da categoria.

Reajuste parcelado

Além disso, é alvo de críticas a criação da Lei Estadual de Responsabilidade Fiscal. O presidente do Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores da Polícia Civil argumentou que já há uma legislação federal – 101 de 2000 – e só precisa ser cumprida. Na opinião de Isaac Ortiz, a intenção do governo é barrar os aumentos concedidos pelo governo Tarso Genro e que se estendem até 2018. “O governo quer é restringir esse reajuste até 2018. Nós abrimos mão de adicionais, não vamos abrir mão de jeito nenhum desses avanços em termos salariais. Nada que vai quebrar o Estado, está dentro da normalidade”, sustentou o presidente do sindicato, sobre as contras do Piratini.

Porta-voz do anúncio das medidas, o chefe da Casa Civil, Márcio Biolchi, afirmou que os questionamentos que vierem a ser feitos pelos servidores são legítimos e que o governo está aberto ao diálogo. Contudo, ele destacou que o ajuste é fundamental diante da situação financeira do Estado e que serão tomadas as medidas “quantas forem necessárias”, repetindo declaração feita pelo próprio governador, durante a entrega dos projetos na Assembleia.

Pacote foi recebido pelo presidente da Assembleia, Edson Brum, e deve causar polêmica no Legislativo|Foto: Vinicius Reis/ AL RS
Pacote foi recebido pelo presidente da Assembleia, Edson Brum, e deve causar debate acalorado no Legislativo|Foto: Vinicius Reis/ AL RS

Os projetos encaminhados para a Assembleia

Lei de Responsabilidade Fiscal – Atualmente, há uma legislação federal de responsabilidade fiscal. Agora, o governo elaborou uma específica para o Estado e que contempla alguns critérios da federal.  Pelo projeto do RS, o administrador não poderá fazer despesas além do  período de sua gestão sem condições financeiras. Por exemplo, um administrador não poderá conceder reajustes parcelados e que tenham de ser pagos por outra gestão. A Lei Federal não proíbe esse tipo de situação. O projeto da lei estadual também estabelece o percentual de 75 % para custeio e investimento e 25% com folha do pagamento da receita do Estado

Revisão dos benefícios fiscais – Para os exercícios de 2016, 2017 e 2018, os benefícios fiscais serão limitados até 70% do valor original concedido. Previsão de aumento da arrecadação com a medida é de R$ 30 milhões por ano

Mudanças nas alíquotas do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCD) – Propõe um escalonamento de faixas para a cobrança do imposto. Hoje, é cobrada uma alíquota fixa de 4%. A partir da alteração, haverá progressividade e quem ganhar uma grande doação ou herança maior pagará mais. Haverá uma tabela e para casos de heranças, as alíquotas variam entre 0, 3%, 4%, 5% e 6%. Para doações, as variações vão de 3 a 4%

Incorporação de função gratificada – Proíbe o servidor de incorporar função gratificada entre diferentes poderes para fins de aposentadoria. Hoje, por exemplo, um professor ou policial pode trabalhar na Assembleia Legislativa ou no Ministério Público e incorporar uma função gratificada, dando um plus na remuneração. Depois, o Estado pagará sua aposentadoria acrescido desse valor. Se o projeto for aprovado, a medida não atingirá servidores que exerceram ou exercem função gratificada até a publicação da lei

Licença capacitação – Projeto do governo do Estado transforma a licença prêmio em licença capacitação, concedida a cada cinco anos por um período de três meses. Se o projeto for aprovado, além da transformação, não terá mais caráter nem indenizatório. Como se trata de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) em caso de ser aprovada, valerá para todos os poderes do Estado. A PEC não atinge licenças já concedidas, ainda não gozadas, e quinquênio em andamento

Câmara de Conciliação de Precatórios – Propõe a negociação das dívidas de acordo com a ordem cronológica de pagamentos e prevê desconto de 40% do valor total. Os acordos serão feitos pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e homologados pela Justiça. Hoje, não esse tipo de negociação

Criação da Banrisul Seguradora – Projeto prevê a criação de uma estrutura societária para atual no ramo de distribuição, previdência e capitalização

Revisão de fundos – Projeto prevê a extinção de 13 fundos que estariam inativos há três ou mais anos. Os que tiverem saldos não utilizados irão reverter os recursos Tesouro do Estado. Entre eles, está o Fundo de Reaparelhamento das Estradas

Corpo Voluntários de Militares Inativos – Projeto propõe que militares já aposentados possam trabalhar no videomonitoramento, mecanismo que auxilia a atuação da segurança, liberando os policiais para atuar na rua. Os brigadianos inativos receberiam um abono por permanência. Hoje, há policiais aposentados que trabalham em escolas e no Ministério Público. Com a medida, segundo governo, 200 brigadianos poderiam ser liberados para atuar no policiamento na rua

Critério para promoção de oficiais da Brigada Militar – Governo propõe mudanças nos critérios de ascensão, priorizando uma maior valorização dos critérios objetivos acumulado ao longo da carreira. Será vedada, por exemplo, a promoção por merecimento. Hoje, um policial vai trabalhar em outro poder ou em uma secretaria do governo, que não a pasta de Segurança, tem promoção por merecimento. A partir de mudanças feitas em 2012, o critério subjetivo teria maior peso, o que foi considerado ilegal pelo STF, anulando promoções de oficiais no Estado a partir das alterações

Readaptação de militar estadual – Projeto propõe que brigadianos com limitação da capacidade física ou mental poderão exercer atividades administrativas após avaliação medica. Hoje, não há essa possibilidade.

Sul21