ZERO HORA: Pagamento de auxílios a servidores de todos os poderes custou ao Estado R$ 483 milhões em 2016

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Benefícios ajudam a explicar a formação de vencimentos que superam o teto constitucional, atualmente calculado em R$ 30,4 mil no RS

O Estado gastou cerca de R$ 483 milhões, em 2016, com o pagamento de diferentes tipos de auxílio destinados a categorias profissionais de todos os poderes — a exemplo de benefícios como auxílio-moradia ou auxílio-alimentação. Ao lado de outras formas de remuneração, como o pagamento retroativo de licenças-prêmio, os chamados “penduricalhos” turbinam os contracheques e ajudam a compor supersalários que extrapolam o teto constitucional.

Por meio de consultas ao Portal Transparência RS na internet e ao Tribunal de Contas do Estado (TCE), ZH mapeou o pagamento de pelo menos R$ 294 milhões em auxílio-alimentação, R$ 91 milhões em auxílio-transporte ou condução e R$ 74 milhões em auxílio-moradia desde o começo do ano até 22 de dezembro. Benefícios envolvendo creche e funeral somaram outros R$ 23 milhões. O auxílio-babá representou R$ 508 mil.

Foto: Diagramação/ZH
 Pagos a título de indenização, acabam driblando o limite imposto pelo teto constitucional — atualmente calculado em R$ 30,4 mil no Rio Grande do Sul — por não serem enquadrados legalmente como salário.

Magistrados, promotores e procuradores estão entre os principais beneficiários desses valores. A verba de alimentação para integrantes do Judiciário ou do Ministério Público, por exemplo, recebeu reajuste de 10,6% neste ano e chegou a R$ 884 por mês.

Uma análise da folha de pagamento de 1.210 juízes e desembargadores do Estado em outubro demonstra que o total de créditos superou o valor do teto em 92% dos casos. Isso engloba todo tipo de pagamento, incluindo indenizações e vantagens eventuais, e desconsidera qualquer desconto. Quando se debitam os descontos, 42% das remunerações ficaram acima do valor de referência do teto. Isso não significa necessariamente uma irregularidade, já que podem estar incluídas férias, indenizações e outros recursos não submetidos ao teto, mas reforça o debate sobre o excesso de pagamentos na forma de auxílio e rubricas semelhantes.

— As indenizações não podem ser consideradas salário, e só entram no contracheque porque não faria sentido arcar com duas folhas diferentes.

O auxílio-moradia é pago em função de decisão judicial que determinou que deveria ser pago a todos os juízes do país, e o auxílio-alimentação é decisão do Conselho Nacional de Justiça. Mas existe uma ideia básica na magistratura de que seria mais adequado valorizar o tempo de serviço em vez desse tipo de benefício — observa o desembargador Túlio Martins, presidente do Conselho de Comunicação Social do Tribunal de Justiça.

Foto: Diagramação/ZH

Licenças-prêmio retroativas turbinam valores no Executivo

A folha do Ministério Público indica, em outubro, valores além do teto para 23% dos 705 promotores e procuradores incluídos no levantamento. Não entram nessa conta as indenizações e outras remunerações não consideradas como parte do salário, mas podem estar presentes adicionais de férias e outros valores eventuais.

— Todos esses auxílios têm caráter indenizatório, como uma ajuda de custo quando alguém vai de uma promotoria a outra por uma promoção — diz a subprocuradora para assuntos administrativos do Ministério Público Estadual, Ana Petrucci.

Foto: Diagramação/ZH

No caso do Executivo, quando se analisam os 10 maiores vencimentos pagos em outubro, sete foram turbinados pelo pagamento de licenças-prêmio indenizadas em caráter retroativo.

Ou seja, licenças não usufruídas foram convertidas em dinheiro. Veja, nos quadros ao lado, a composição dos salários nos diferentes poderes e o que explica as grandes somas recebidas por parte do funcionalismo.

Transparência ainda é limitada nos portais

Todos os poderes do Estado contam com páginas de transparência na internet nas quais é possível consultar a remuneração de seus servidores, mas ainda há obstáculos para analisar a massa de dados salariais, fazer comparações ou organizar os números.

O artigo 8º da Lei de Acesso à Informação determina a possibilidade de “gravação de relatórios em diversos formatos eletrônicos, inclusive abertos e não proprietários, tais como planilhas de texto, de modo a facilitar a análise das informações”. Somente as páginas do Executivo e do Ministério Público viabilizam baixar os dados em formato de planilha eletrônica.

O Judiciário possibilita copiar os dados como páginas de PDF (o que impede cálculos automáticos), e a Assembleia não permite qualquer forma de download — somente a consulta individual. Nesse caso, se alguém quiser verificar qual o salário mais alto, teria de buscar os nomes dos mais de mil funcionários um a um.

Os obstáculos à transparência não se resumem à internet: em contatos por telefone e via e-mail, a Assembleia também não se dispôs a informar os nomes de integrantes de gabinetes dos deputados (a fim de permitir uma pesquisa mais ampla sobre os salários na Casa) ou o quanto é gasto com o pagamento de auxílios.

— Tudo o que for colocado em páginas de transparência deve utilizar formatos abertos e que facilitem a análise e a comparação de dados, o que chamamos de “legível por máquina”. Infelizmente, isso ainda não é uma prática comum por falta de vontade política ou, no caso de municípios pequenos, por falta de recursos — observa o diretor-executivo da ONG Transparência Brasil, Manoel Galdino.

O superintendente-geral da Assembleia, Luiz Fernando Rodriguez Júnior, afirma que a Casa é a quarta colocada entre os parlamentos estaduais em um índice de transparência. Ele acrescenta que está em andamento projeto para facilitar o acesso e o download dos dados.

— Nos primeiros meses de 2017, deveremos disponibilizar os dados em formatos mais acessíveis — promete o superintendente.