Tulio Milman: “Não consigo ver o trabalho como um castigo do qual a aposentadoria nos libertará”

Trabalhar não é castigo

Quero trabalhar até os cem anos. É um objetivo de vida. Meu avô, que era representante comercial, ia ao escritório até pouco antes de morrer, perto dos 90. Minha avó embaralhava as cartelas de cores das roupas para que ele pudesse, já fraco e doente, organizá-las e se sentir útil. Era um gesto lindo de generosidade.

Meu avô chegou ao Brasil com 32 anos, fugindo do nazismo na Alemanha. Desembarcou no Rio de Janeiro com uma mão na frente e outra atrás. Construiu uma vida digna com muito trabalho.

Meu pai, advogado, aos 84, cumpre um autoexigido expediente diário. Minha mãe, aos 72, também. Não consigo ver o trabalho como algo ruim, como um castigo do qual a aposentadoria, quanto mais cedo melhor, nos libertará. É claro que tem dias ruins, épocas de desmotivação, períodos de dúvidas. Mas eu quero trabalhar até os cem anos. Certamente sem a urgência de hoje.

Imagino algum trabalho voluntário ou algo ligado à arte. Numa época em que minha missão seja apenas ajudar. Porque é isso que tem de ser feito.

Sei que grande parte dos brasileiros é oprimida por chefes tiranos, por equipamentos desconfortáveis, por salários indignos. Entendo que sair de casa nessa insegurança, muitas vezes arriscar a vida e ser pouco valorizado é injusto e pouco inspirador. Então, é isso que devemos mudar. Empresas e empreendedores comprometidos em transformar ambientes de trabalho em lugares de liberdade, de alegria. Sempre com base em uma educação inclusiva, plural e eficiente. Para que, nesse debate sobre a reforma da Previdência, nossos filhos não aprendam a lição errada de que trabalhar é um fardo.

Talvez um dia no futuro, mais cansado, eu mude de ideia. Repense essa convicção e queira parar de vez. Mas hoje, chegando aos 50, tudo o que eu quero é seguir em frente. Não importa quais sejam os meus direitos. Se eu puder, quero trabalhar até os cem anos.

ZERO HORA