ZERO HORA: Por que as medidas prometidas pelo governo não estancam a onda de violência no RS

Secretário da Segurança Pública do Estado, Cezar Schirmer, admite a dificuldade em enfrentar o avanço dos homicídios 

Por: Débora Ely

Quase seis meses depois de assumir uma das áreas mais conflagradas no Rio Grande do Sul, o comando da segurança pública, Cezar Schirmer acumula promessas parcialmente cumpridas e resultados bem aquém dos esperados. Ao invés de reduzirem, os assassinatos dispararam em janeiro e seguem em ritmo desenfreado neste mês — estima-se que o último final de semana entre para os registros como o mais violento da história gaúcha.

O secretário admite a dificuldade em enfrentar o avanço dos homicídios, fenômeno que, na sua avaliação, está relacionado à guerra do tráfico. Schirmer destaca que as iniciativas adotadas nos últimos meses não têm efeito imediato na redução da criminalidade:

— A maioria dos homicídios envolve traficantes em disputa por território. Não estou justificando, mas eles estão disputando um mercado: o mercado da droga. O mercado da droga é crescente no Brasil e vivemos um caos no sistema prisional. Existem diversas causas, e eu só ouço para colocar mais brigadianos nas ruas. Pode amenizar, mas não vai resolver — disse, em entrevista a ZH (leia a íntegra aqui).

Mesmo que em ritmo desacelerado, a secretaria garantiu, nos últimos meses, maior agilidade na criação de vagas prisionais e promete anunciar ainda neste mês as três cidades que receberão novos presídios. Paralelamente, o governo inaugurou o primeiro dos cinco centros de triagem para abrigar detentos provisórios e buscou estabelecer parcerias com o Exército e a Força Nacional. Porém, para o especialista em gestão de riscos e segurança estratégica Gustavo Caleffi, trata-se de medidas insuficientes perante o atual quadro de violência:

— Não existe ação estadual que vá impactar na redução da criminalidade no Brasil. O problema é federal, passa por legislação, sistema prisional, banalização da vida humana e descredibilidade nas instituições de segurança pública. Chegamos ao que chamo de caos sociais, uma inversão total de valores, na qual o delinquente não tem medo nenhum de agir. Essas ações não surtem efeito, são paliativas — avalia.

O subcomandante da Brigada Militar (BM), coronel Mário Ikeda, corroboda com o entendimento:

— Os homicídios estão além da questão do policiamento ostensivo. Estão relacionados, na grande maioria, a facções criminosas em disputa por áreas. Existem condições de fazer frente, aumentando a capacidade da polícia, mas não bastam somente ações da BM, mas também ações como a ressocialização de presos, por exemplo.

A secretaria vê na chegada de 129 homens da Força Nacional, ainda sem previsão de liberação pelo governo federal, uma medida analgésica para a redução de homicídios. Estão previstas operações dos agentes em conjunto com 400 policiais militares com foco direcionado à queda nos assassinatos. Caleffi adverte que soluções a curto prazo só surtiriam efeito se contassem com grande aporte financeiro — uma condição distante da realidade em um Estado com previsão de déficit bilionário:

— Para reduzir a criminalidade em um curto espaço de tempo, teria de haver dinheiro para mecanismos de ostensividade. Mas não há o dinheiro.

Veja as medidas anunciadas por Schirmer

Anúncio sobre criação de vagas em presídios foi feita por Schirmer no primeiro dia como secretárioFoto: Mateus Bruxel / Agencia RBS

Medida:abertura de vagas no sistema prisional
Anúncio: setembro de 2016
Situação: em andamento
Contexto: em seu primeiro dia como secretário, Schirmer elencou a criação de vagas em presídios como a prioridade número um de sua gestão. Mesmo que a burocracia não caminhe no mesmo ritmo do aumento da criminalidade, iniciativas neste sentido avançaram. Uma delas está na construção de mil vagas fruto de uma permuta entre o Estado e a Companhia Zaffari. O local da nova casa prisional deve ser anunciado ainda neste mês.

Centro de Triagem foi construído em parceria com o ExércitoFoto: Omar Freitas / Agencia RBS

Medida: parcerias com o Exército
Anúncio: setembro de 2016
Situação: cumprida
Contexto: diante da escassez de recursos, Schirmer buscou parcerias com o Exército para auxiliar no combate à criminalidade. O próprio secretário buscou a colaboração com a instituição, que resultou em ao menos seis operações conjuntas de policiamento com a Brigada Militar. Trata-se de um número pouco expressivo, mas que auxiliou a reforçar a vigilância em algumas regiões. Veio também do Exército a mão de obra para a construção do primeiro Centro de Triagem para presos provisórios, iniciativa que resultou uma economia milionária para os cofres do Estado.

Primeiros homens da Força Nacional chegaram ao Rio Grande do Sul em agosto do ano passadoFoto: Lauro Alves / Agencia RBS

Medida: reforço da Força Nacional para investigação de homicídios
Anúncio: novembro de 2016
Situação: cumprida
Contexto: o chamamento da Força Nacional para reforçar o policiamento ostensivo chegou ainda antes do anúncio de Schirmer como secretário. Em 28 de agosto, 136 agentes desembarcaram em Porto Alegre atendendo a uma convocação do vice-governador, José Paulo Cairoli. Nos meses seguintes, quase metade do efetivo deixou o território gaúcho gradativamente porque teve de se deslocar para outras regiões conflagradas do país e, agora, o Rio Grande do Sul aguarda a chegada de mais 129 homens para trabalhar pelos próximos seis meses. A Schirmer, coube o anúncio de impulso nas investigações de assassinatos com o incremento da Força Nacional. O trabalho começou em dezembro. Desde então, 25 agentes e um delegado auxiliam o serviço de inteligência nas Delegacias de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) na Capital.

Medida: criação de Centro de Triagem para detentos
Anúncio: dezembro de 2016
Situação: em andamento
Contexto: após a superlotação de carceragens de delegacias atingir o colapso, com presos amarrados em lixeiras e corrimãos, o secretário anunciou a criação de centros de triagem para detentos provisórios. Com atraso de dois meses, a promessa cumpriu-se nesta segunda-feira, quando foi inaugurado o espaço nas dependências do Instituto Psiquiátrico Forense (IPF). A estrutura deve desafogar parcialmente as celas em delegacias enquanto não se criam novas vagas em presídios, uma vez que o centro conta com 84 vagas e somente 24 foram entregues até o momento. Os demais espaços devem ser finalizados dentro de 15 dias.

Foto: Arte ZH / Agência RB