ZH: Auxílio-moradia já custou R$ 219 milhões no Rio Grande do Sul

Foto: Camila Domingues / Especial

Benefício dado a juízes, desembargadores e integrantes de MP e TCE é baseado em liminar que completa três anos sem julgamento

Por: Fábio Schaffner ZERO HORA

Amparado em uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) que completa três anos neste mês, o Rio Grande do Sul já desembolsou R$ 219 milhões no pagamento de auxílio-moradia a membros do Judiciário, do Ministério Público (MP) e do Tribunal de Contas do Estado (TCE). O montante equivale a 22 meses dos gastos com transporte escolar na rede pública de ensino ou à metade do custo mensal das forças de segurança, incluindo os salários da Brigada Militar e da Polícia Civil.

No total, 1.438 servidores recebem mensalmente R$ 4.377,73, sobre os quais não incide Imposto de Renda. Como não se trata de ressarcimento, não é exigida a apresentação de recibo de um eventual aluguel pago. Mesmo quem tem casa própria no município onde trabalha tem direito ao bônus. O maior volume de beneficiários está no Judiciário: 750 magistrados recebem o auxílio, que já custou R$ 116 milhões. No MP, 671 ganharam R$ 100 milhões. No TCE, há 17 beneficiários, sendo quatro do Ministério Público de Contas. Em três anos, já foram gastos R$ 2,4 milhões.

O benefício é pago desde outubro de 2014, logo após o ministro Luiz Fux conceder liminar em ação proposta por um grupo de juízes federais. Eles cobravam o direito ao auxílio-moradia, previsto na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), em cidades onde não há residência oficial à disposição dos magistrados. Dez dias depois, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) fizeram o mesmo pedido. Fux então ampliou a abrangência da decisão, alcançando todos os juízes do país.

Segundo a ONG Contas Abertas, em todo o país já teriam sido gastos R$ 4,5 bilhões desde a liminar. O valor leva em consideração um contingente de 17 mil magistrados e cerca de 13 mil procuradores aptos a receber a vantagem. Pelas regras, só não tem direito o servidor que for casado com outra pessoa que já receba o benefício.

“E nem se diga que o referido benefício revela um exagero ou algo imoral ou incompatível. Cada categoria de trabalhador possui direitos, deveres e verbas que lhe são próprias”, escreveu Fux no despacho. Embora a decisão que sustenta a legalidade dos pagamentos seja provisória, não há a menor previsão para a análise do mérito da ação da AMB e da Anamatra. Para o economista Gil Castelo Branco, diretor da Contas Abertas, é absurdo que uma decisão que gere tamanha despesa fique três anos sem ser julgada:

— É algo inadmissível. Já enviamos carta à presidente do STF, Cármen Lúcia, pedindo que paute o julgamento, mas até agora nada.

A ação está parada no gabinete de Fux. Procurado por ZH, o STF informou que, só após o ministro liberar seu relatório, a presidente da Corte poderá designar uma data para o julgamento. Quando isso acontecer, os ministros terão de decidir sobre a legalidade do benefício e, caso entendam pela impropriedade dos pagamentos, também deverão avaliar eventual ressarcimento aos cofres públicos dos valores desembolsados durante a vigência da liminar.

Presidente do conselho de comunicação do TJ, o desembargador Túlio Martins afirma que a Corte não tem nenhum estudo caso seja obrigada a cobrar dos magistrados os R$ 116 milhões pagos nos últimos três anos:

— Em tese, se trata de auxílio que é para ser gasto no mês, como o vale-alimentação. Neste caso, a Justiça tem entendido que não cabe devolver. Mas seja qual for a decisão, vamos cumpri-la.

Além dos R$ 116 milhões do auxílio-moradia, o TJ já gastou mais de meio bilhão de reais com outro benefício semelhante. Desde 2010, a Corte paga a Parcela Autônoma de Equivalência (PAE), uma compensação dada aos juízes em razão da equiparação salarial da categoria com os deputados federais.

Como de 1994 a 1998 os parlamentares receberam auxílio-moradia, e o benefício não foi pago aos magistrados, os juízes ganharam na Justiça o direito de receber a diferença retroativamente. Até agora, já foram quitados R$ 535 milhões, cifra superior à capacidade anual de investimento do Estado, que em 2016 foi de R$ 483,5 milhões. Ainda faltam ser pagos R$ 22,8 milhões.