PMs se revoltam após presa com oito armas responder em liberdade

Justiça permitiu a ré responder em liberdade – Reprodução

A classe da magistratura criticou o desrespeito à decisão

POR JÚLIA COPLE O GLOBO

Imagens que circulam pela web mostram a revolta de dois policiais militares do Alagoas que viram solta uma mulher que prenderam no dia anterior com oito armas. Na gravação, os agentes chegam à casa de Maria Cícera Oliveira Lima Santos, de 31 anos, a questionam por que está em liberdade e criticam o trabalho da Justiça, que a deixou responder pelo crime fora da cadeia. A classe da magistratura criticou o desrespeito à decisão.

“Não devo nada a ninguém. Estou com um alvará de Justiça”, responde a mulher, na porta de casa, no bairro Tabuleiro do Martins, em Maceió. Os policiais, lotados no 1º BPM, começam a ironizar a decisão da Justiça e chegam a pedir “desculpas” por quebrar a porta da residência, apreender as oito armas e levar a ré algemada em uma viatura no dia anterior.

“É o nosso Código Penal. Parabéns, Brasil”, diz um deles, com um riso irônico. “Não é porque a senhora está solta, é porque é foda”, tenta explicar o outro para Maria Cícera.

A atitude dos PMs despertou críticas por parte de entidades de classe da magistratura. O magistrado Ricardo Jorge Cavalcante Lima, plantonista que concedeu o alvará de soltura para Maria Cícera, explicou em nota que a cidadã não tem registro de passagem pela polícia nem antecedentes criminais, possui residência fixa, trabalho fixo e uma filha menor de idade. Tais características, conforme a lei brasileira, a qualificam para responder em liberdade, destacou Lima, por meio da assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de Alagoas.

“As armas foram encontradas em sua casa, mas a mulher alegou que as armas seriam de seu namorado, que possuiria as chaves da residência. O juiz ressalta ainda que o próprio Ministério Público de Alagoas opinou pela soltura”, defende a nota sobre a atuação do magistrado, que expediu o alvará de liberdade provisória na audiência de custódia.

Comando da PM diz não questionar Justiça

No sábado, os agentes do 1º BPM apreenderam oito revólveres, todos sem munição, na casa de Maria Cícera. Os militares haviam recebido uma denúncia de que a residência servia como ponto de comercialização de drogas. Segundo a polícia, a proprietária autorizou a entrada dos militares, que depois a conduziram à Central de Flagrantes na qual foi lavrado o auto de prisão por posse ilegal de arma de fogo. No dia seguinte, os policiais voltaram à casa e souberam do resultado da audiência de custódia.

Em nota, o Comando da Polícia Militar de Alagoas informou que não orienta sua tropa a questionar procedimentos do Poder Judiciário e que sempre cumpriu toda e qualquer decisão deste poder. Mas o vídeo dos agentes suscitou a revolta da Associação Alagoana de Magistrados (Almagis), que saiu em defesa de Lima e da categoria contra o que chamou de “desrespeito às instituições democráticas”.

A Almagis frisou que “não admitirá que manifestações desestabilizem a atuação da magistratura e diminuam a força do Poder Judiciário”. A associação reforçou que “tomará as medidas cabíveis” para que os militares sejam responsabilizados.

A entidade ainda explicou que a audiência de custódia, na qual Maria Cícera recebeu o alvará de soltura, está regulamentado e segue a aplicação dos Tratados de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil. “Tem-se por certo que, ao conceder a liberdade provisória, o magistrado agiu em estrita obediência aos parâmetros constitucionais que lhe servem como baliza”, lê-se na nota.